Debate

Etarismo: o preconceito com a idade é coisa do passado

Tema tem sido cada vez mais discutido diante do envelhecimento populacional no País e casos de discriminação a idosos

Foto: Jô Folha - DP - Aos 69 anos, Laerte Soria Leite administra uma correaria e loja de artigos gaúchos desde 2011, local no qual trabalha há 51 anos

Por Vitória de Góes
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Cada vez mais, um termo vem sendo amplamente utilizado e discutido: o etarismo. A palavra refere-se ao preconceito por conta da idade, tendo como alvo principalmente pessoas idosas. Na prática, essa discriminação acontece até mesmo de maneira velada, tendo em vista crença ainda enraizada na sociedade de que um indivíduo na terceira idade já não teria mais valor produtivo. O que leva muitas vezes à demissão dessas pessoas de seus trabalhos, ou dificuldade delas em serem contratadas. Ou, ainda, o desmerecimento quanto à capacidade física e mental.

O tema preocupa, uma vez que a população idosa vem crescendo no País e, portanto, em um breve futuro o Brasil deve enfrentar o chamado envelhecimento da força de trabalho. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre 2012 e 2021 a população com 60 anos ou mais cresceu 39,8%, passando de 22,3 milhões para 31,2 milhões. Enquanto isso, no mesmo período, a população jovem com menos de 30 anos reduziu em 5,4%.

Cenário que leva às empresas uma necessidade de se prepararem para novas políticas de empregabilidade, além da construção de outro olhar para os idosos. Até porque, esses estão cada vez mais ativos e em plena capacidade de usar a experiência a favor do trabalho. Não é raro encontrar pessoas na faixa dos 70 e 80 anos tocando negócios próprio. O que contribui para a autonomia e até a saúde.

A médica responsável técnica na Associação Beneficente dos Aposentados e Pensionistas de Pelotas (Abapp), Sonia Rohnelt Fontoura, defende que "manter-se ativo, trabalhando ou participando de projetos contribui muito para a melhor qualidade de vida dos idosos". De acordo com a profissional, apenas alguns exercícios ou trabalhos que demandem muito esforço físico não são propriamente recomendados. Porém, ainda assim é uma questão que varia de cada pessoa.

Um exemplo de alguém que tem disposição e não pretende parar de trabalhar tão cedo é Laerte Soria Leite. Aos 69 anos, ele administra uma correaria e loja de artigos gaúchos desde 2011, local no qual trabalha há 51 anos. E afirma que pretende seguir à frente dos negócios pelo menos até o centenário da loja, que atualmente está há 93 anos com as portas abertas. "Eu particularmente acho que parar é um fracasso. sSe você tiver saúde e boa vontade, você não pode parar nunca. Você para de trabalhar, começa a ficar com a cabeça desocupada e até pensar o que não deve, então para a terceira idade isso é muito ruim", declara Laerte.

Quando não está trabalhando no comércio, está no meio rural, andando a cavalo e fazendo atividades do meio. O filho, Laerte Jr., diz que o pai é muito ativo e sua experiência é o que mantém a loja funcionando e não concorda com a visão de que a idade possa ser um dificultador no mercado. "Eu acho que é justamente ao contrário. Ajuda, traz mais força, tu tem um conhecimento maior sobre a sua área, então contar com essa experiência faz com que a gente aprenda bastante."

Atividades para terceira idade

Pensando em proporcionar melhor qualidade de vida para a terceira idade, surgem projetos voltados para esse público. Em Pelotas, desde 1990 existe um grupo que atua com atividades para idosos: o Centro de Extensão em Atenção à Terceira Idade da Universidade Católica de Pelotas (Cetres/UCPel). De segunda a sexta o Centro promove oficinas que englobam cultura, saúde e cidadania na terceira idade. Alguns exemplos são os grupos de inclusão digital, espanhol, dança, crochê e fisioterapia. Inclusive, boa parte dos projetos são coordenados por idosos, enquanto outros são com profissionais e alunos da universidade.

O coordenador do Cetres, Hartur Marcel Torres da Silva, é psicólogo e especialista em saúde do idoso e explica que o local trabalha com a mudança de perspectivas sobre o envelhecimento. "Nós não entendemos o envelhecimento humano como um processo de perdas cognitivas, motoras ou de mobilidade, mas como um momento de riqueza, conhecimento, novas possibilidades e realizações", defende.

Atualmente, cerca de 220 pessoas a partir dos 50 anos participam das atividades do Centro. "Se manter ativo possibilita maior qualidade de vida porque a pessoa se mantém em movimento, convive com outras pessoas, conhece novos projetos, amplia os laços de amizade, é muito importante", explica o coordenador sobre os benefícios.

Esses benefícios são sentidos por Marlene Guidotti, 80, que comanda a oficina de tapeçaria de forma voluntária há 23 anos. "Me aposentei jovem, então procurei atividades que eu pudesse me envolver. Também faço trabalho voluntário de distribuição de alimentos para pessoas em situação de rua", conta.

Uma das referências do time de mais de 15 senhoras que desenvolvem trabalhos em tapeçaria é a dona Cecy Dias Hartlebem. Aos 88 anos, ela participa de diversas atividades do Cetres e expõe a felicidade por se manter ativa. "Estar aqui muda tudo, a gente se sente 'normal' e não apenas um 'velho', fazemos amizades, não ficamos sozinhos."

Para participar, os interessados podem ir diretamente à sede, na avenida Domingos de Almeida, 3.150, no segundo andar do Instituto de Menores Dom Antônio Zattera. O local funciona de segunda a sexta-feira, das 8h às 12h e das 13h às 17h.

Pauta em discussão na região

Recentemente o município de Capão do Leão discutiu a atitude do vereador David Martins (PTB), que em um grupo do WhatsApp criticou o prefeito Vilmar Schmitt (PP). A postura do parlamentar vem sendo considerada como etarismo, uma vez que teria vinculado as críticas à idade do gestor.

Na mensagem, David diz que "ele [Schmitt] é um homem bom, mas um gestor com 79 anos que tem dificuldade para ler e escrever, interpretar leis e não sabe usar um celular Android, muito menos um computador, passou o seu tempo". Ao final, ainda completa: "quem contrata um gerente de empresa com 80 anos? A população contratou".

Ao DP o prefeito Vilmar se defendeu dizendo que por ser idoso, tem a vantagem de ter muita experiência acumulada. "É lamentável ver um jovem vereador que poderia ter um futuro brilhante na política ter tal atitude e um pensamento tão desrespeitoso em relação aos idosos. Eu, assim como o presidente deste País, sou um idoso e fui eleito pelo povo, independentemente da minha idade."

Já o vereador disse que a sua crítica não foi voltada à pessoa, mas ao gestor. "As críticas que eu fiz foram em relação à falta de atualização e até de preparo, de conhecimento de leis e isso tem pesado no governo dele". E acrescentou: "não que eu tenha preconceito sobre a idade dele, mas à sua falta de preparo".

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